ARTE, AFETOS E ETNOGRAFIA
Qual é o poder da arte no tempo em que vivemos? A arte, que em um determinado momento da história já foi dotada de poderes mágicos, de aura, se transformou junto à sociedade da qual faz parte. Assim como anunciado pelo crítico e ensaísta Walter Benjamin, uma arte inicialmente vinculada a objetos sagrados se tornou mercadoria. Tal mercadoria, de simples objeto, se transformou em ideias, processos, relações, experiências. A arte expandiu suas possibilidades e, para ser legitimada, passou a depender de sua inserção no que o crítico e filósofo Arthur Danto definiu como “Mundo da Arte”.
O “Mundo da Arte” absorve diversas linguagens e, por vezes, causa estranhamentos, mas ainda se mostra como um meio restrito a poucos, de difícil acesso a artistas de territórios periféricos, portanto, a busca de espaços alternativos e de políticas públicas de fomento são de extrema importância para o surgimento de novos nomes e a existência dos que lutam por um lugar ao sol. Espaços digitais, como a internet, se tornam locais de resistência, nos quais a arte pode ser produzida, exposta e consumida por públicos diversos. A partir desse contexto, a Distópica Galeria de Arte, uma galeria de artes digitais concebida a fim de ser um “ponto de respiro” para as artes, apresenta a exposição Arte Felicidade – Conversas com Artistas e Fazedores de Cultura do Bairro Jardim Felicidade, em Belo Horizonte, de Liliane Rosa.
Liliane Rosa aproxima arte e vida ao abordar a alteridade, isto é, “o outro”, por meio de uma pesquisa com artistas do bairro Jardim Felicidade, território periférico da cidade de Belo Horizonte, no qual a luta e a resistência são elementos constitutivos das identidades locais. A interdisciplinaridade entre a arte e a sociologia retrata algo que, na arte contemporânea, o crítico e historiador Hal Foster define como “artista etnógrafo”. Liliane Rosa desempenha esse papel a partir de sua formação em Ciências Sociais e seus afetos que derivam de suas vivências como professora da rede estadual de ensino, na região situada no território que lhe serve de objeto de pesquisa, o bairro Jardim Felicidade. Com legitimidade e afeto, Liliane supera barreiras e mostra por meio de imagens e textos, a realidade de artistas que, assim como ela, lutam para oferecer ao mundo a verdade que bate em seus corações: a arte e a cultura.
Raphael Ferreira
Curador